POEMA 27/31
O Mostrengo, Carlos Alberto Santos ( 1933 - 2016) |
Fonte:
Data de consulta: 13 de março de 2022.
O MOSTRENGO
O mostrengo
que está no fim do mar
Na noite de breu
ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a
chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João
Segundo!»
«De quem são as
velas onde me roço?
De quem as quilhas
que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso,
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso,
«Quem vem poder o
que só eu posso,
Que moro onde nunca
ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»
Três vezes do leme
as mãos ergueu,
Três vezes ao leme
as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um Povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo;
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um Povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo;
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»
Fernando Pessoa (1888 - 1935)
Data de consulta: 27 de fevereiro de
2022.
Poema e pintura sugeridos por: Gil Matos, 9.º A, n.º 6.
Leitura do poema: Gil Matos.
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