sábado, 18 de dezembro de 2021

ESCRIT@TOP.COM - CONTO II «O RELÓGIO DO PRISIONEIRO»

Fotografia: @Ana Marques

 O RELÓGIO DO PRISIONEIRO 

Num reino distante, habitava um rei. Um rei muito querido por todos e que fazia sempre tudo o que estava ao seu alcance para melhorar a vida da população do seu reino. Porém, raramente tinha tempo para si.

Certo dia, numa tarde de chuva, embora com um pouco de sol, um grupo de incontáveis homens invadiram o palácio. Tiros, bombas, facadas, socos, pontapés e gritos desesperados ecoaram pelo enorme palácio. Houve seis mortes, dentro dessas seis, a do rei. O rei que mais fora amado durante toda a vida daquele reino tinha sido morto dentro dele da pior forma possível. E não haveria mais ninguém que conseguisse estar à altura do falecido soberano. Apenas a população do reino de Cartoza conseguiria entender o porquê de o rei ser tão importante para a continuação da boa qualidade de vida naquele lugar.

Marco, o rei, não era apenas um bom comandante do reino, pelo seu jeito, pelas suas manias e pela entrega absoluta às suas gentes.  Ele tinha um relógio. O relógio mais louco de todos. Não era um relógio qualquer, que marcava as horas. Aquele era diferente. Não só nos dava noção do tempo, como também transmitia poderes a quem o tivesse, ou seja, apenas ao rei. Ninguém mais além de Marco tinha um relógio assim ou parecido. Tinha sido feito exclusivamente para ele. Agora, lamentavelmente, os seus benéficos poderes iriam com Marco para o caixão. E o reino de Cartoza ficava, assim, à mercê de tudo o que viesse.

Anos após a morte do rei, um novo homem chegou ao reino de Cartoza. Mas algo nele chamou a atenção de todos. Ele tinha o relógio! Era aquele, todos tinham a certeza. Aquele era o relógio do falecido rei. Denúncias foram feitas e o homem acabou por ser preso. Todos os juízes que tinham concretizado julgamentos sabiam que algo ali estava muito mal contado. Aquele homem escondia algum segredo. Era completamente impossível ele ter o mesmo relógio que Marco. Mas como poderia ser considerado roubo, se o falecido rei tinha levado o seu fiel relógio consigo no pulso?

Durante dias, meses e anos, os investigadores do caso mal dormiram à procura de respostas. Mas o mistério parecia insondável. O homem que dizia chamar-se Raul não proferia uma palavra. Sorria apenas. Chegaram a cogitar a ideia de que ele gostava da sua estada atrás das grades. E, de facto, ninguém o tiraria de lá até a verdade vir ao de cima!

Após muito tempo de intermináveis investigações, a primeira teoria estava feita. Os investigadores descobriram que o verdadeiro nome do prisioneiro era Marco, tal como o do rei. Concluíram ainda, com base em novas fontes que tinham estado presentes no atentado, que afinal o rei mal teria sido atacado naquela fatídica tarde. Logo, tudo parecia indicar que Marco tinha forjado a sua própria morte.

No dia do julgamento, provavelmente o último, o prisioneiro sentia que o pior estava por vir.

E estava certo! A verdade tinha sido descoberta e Marco foi obrigado a reassumir o trono.

─ Porque é que abandonou o seu povo? Porque é que mentiu em tribunal? Sabe que isso pode custar-lhe mais uns tempinhos atrás das grades, não sabe, Vossa Majestade? – perguntou Daniel, o investigador, de forma irónica e ameaçadora.

─ Não irá custar nada. Não se eu estiver realmente morto.

Dito isso, o antigo rei tirou um pequeno frasco de veneno do bolso do seu casaco, bebendo tudo de um só golo, caindo sem vida no chão logo de seguida, e mergulhando, assim, e pela segunda vez, no desejado anonimato.

O pequeno frasco de veneno era, afinal, o relógio do prisioneiro.

 Ana Marques, 9.º A, n.º 3.

1 comentário:

Unknown disse...

Linda da prima, muito orgulhosa de ti 😘❤️😍