Fotografia: @Ana Marques |
O RELÓGIO DO PRISIONEIRO
Num reino
distante, habitava um rei. Um rei muito querido por todos e que fazia sempre
tudo o que estava ao seu alcance para melhorar a vida da população do seu
reino. Porém, raramente tinha tempo para si.
Certo
dia, numa tarde de chuva, embora com um pouco de sol, um grupo de incontáveis
homens invadiram o palácio. Tiros, bombas, facadas, socos, pontapés e gritos
desesperados ecoaram pelo enorme palácio. Houve seis mortes, dentro dessas
seis, a do rei. O rei que mais fora amado durante toda a vida daquele reino
tinha sido morto dentro dele da pior forma possível. E não haveria mais ninguém
que conseguisse estar à altura do falecido soberano. Apenas a população do
reino de Cartoza conseguiria entender o porquê de o rei ser tão importante para
a continuação da boa qualidade de vida naquele lugar.
Marco, o
rei, não era apenas um bom comandante do reino, pelo seu jeito, pelas suas
manias e pela entrega absoluta às suas gentes.
Ele tinha um relógio. O relógio mais louco de todos. Não era um relógio
qualquer, que marcava as horas. Aquele era diferente. Não só nos dava noção do
tempo, como também transmitia poderes a quem o tivesse, ou seja, apenas ao rei.
Ninguém mais além de Marco tinha um relógio assim ou parecido. Tinha sido feito
exclusivamente para ele. Agora, lamentavelmente, os seus benéficos poderes
iriam com Marco para o caixão. E o reino de Cartoza ficava, assim, à mercê de
tudo o que viesse.
Anos após
a morte do rei, um novo homem chegou ao reino de Cartoza. Mas algo nele chamou
a atenção de todos. Ele tinha o relógio! Era aquele, todos tinham a certeza.
Aquele era o relógio do falecido rei. Denúncias foram feitas e o homem acabou
por ser preso. Todos os juízes que tinham concretizado julgamentos sabiam que
algo ali estava muito mal contado. Aquele homem escondia algum segredo. Era
completamente impossível ele ter o mesmo relógio que Marco. Mas como poderia
ser considerado roubo, se o falecido rei tinha levado o seu fiel relógio consigo
no pulso?
Durante
dias, meses e anos, os investigadores do caso mal dormiram à procura de
respostas. Mas o mistério parecia insondável. O homem que dizia chamar-se Raul
não proferia uma palavra. Sorria apenas. Chegaram a cogitar a ideia de que ele
gostava da sua estada atrás das grades. E, de facto, ninguém o tiraria de lá
até a verdade vir ao de cima!
Após
muito tempo de intermináveis investigações, a primeira teoria estava feita. Os
investigadores descobriram que o verdadeiro nome do prisioneiro era Marco, tal
como o do rei. Concluíram ainda, com base em novas fontes que tinham estado presentes
no atentado, que afinal o rei mal teria sido atacado naquela fatídica tarde.
Logo, tudo parecia indicar que Marco tinha forjado a sua própria morte.
No dia do
julgamento, provavelmente o último, o prisioneiro sentia que o pior estava por
vir.
E estava
certo! A verdade tinha sido descoberta e Marco foi obrigado a reassumir o
trono.
─ Porque
é que abandonou o seu povo? Porque é que mentiu em tribunal? Sabe que isso pode
custar-lhe mais uns tempinhos atrás das grades, não sabe, Vossa Majestade? – perguntou
Daniel, o investigador, de forma irónica e ameaçadora.
─ Não irá
custar nada. Não se eu estiver realmente morto.
Dito isso,
o antigo rei tirou um pequeno frasco de veneno do bolso do seu casaco, bebendo
tudo de um só golo, caindo sem vida no chão logo de seguida, e mergulhando,
assim, e pela segunda vez, no desejado anonimato.
O pequeno
frasco de veneno era, afinal, o relógio do prisioneiro.
1 comentário:
Linda da prima, muito orgulhosa de ti 😘❤️😍
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