O ano letivo está a começar, há professores que ficaram, outros que voltaram e alguns (há sempre alguns ou muitos) que vêm pela primeira vez.
A escola apresenta-se. Tem nome... nome de escritor, de jornalista, de editor. Mas, afinal, quem é, quem foi Manuel do Nascimento?
Só se conhece verdadeiramente um escritor quando o lemos. No entanto, há biografias que são apelativas, que estimulam o interesse pela leitura, que nos dão a conhecer o homem e que nos fazem querer conhecer a obra.
Descobrimos, há pouco, por mero acaso, uma cuidada e rigorosa biografia de Manuel do Nascimento. Partilhamo-la, aqui, com os nossos leitores, esperando que a sua leitura desperte o interesse pela obra.
MANUEL DO NASCIMENTO (1912-1966)*
Manuel do Nascimento
Correia, de seu nome completo, nasceu em Monchique a 27 de dezembro de 1912 e
faleceu em Lisboa em 30 de dezembro de 1966. Filho de proprietários e
comerciantes desta vila serrana, frequentou na capital a Escola Académica e
depois o Instituto Industrial de Lisboa, tendo aí tirado o curso de Técnico
Superior de Minas.
Nesta profissão,
trabalhou nas minas de Jales, onde travou conhecimento com Soeiro Pereira Gomes
e a literatura de teor social, enquanto acompanhava e convivia com o trabalho
árduo e mal pago dos mineiros, situação que depois retrataria nos seus livros. Nas
minas, veio a contrair uma lesão pulmonar, que o levaria a abandonar esta atividade
e a dedicar-se ao jornalismo, à literatura e à atividade editorial.
No jornalismo,
trabalhou para diversas publicações, nomeadamente O Primeiro de Janeiro, Eva,
Ver e Crer, Mundo, A Cooperação, Portugal
Ilustrado, etc., onde assinou excelentes reportagens, entrevistas e artigos
de fundo. A fotografia foi igualmente uma das suas paixões.
Como escritor, Manuel
do Nascimento foi, em Portugal, um dos ficcionistas da primeira hora neorrealista,
tendo-se estreado, em 1943, com o romance Eu
Queria Viver! (reeditado em 1958), obra que foi considerada pelo crítico
literário João Gaspar Simões uma das «mais humanas e originais que a nova
geração nos tem dado» (Critica III,
2.ª ed.1998).
Neste livro, Manuel do
Nascimento retrata a mulher presa nos condicionalismos sociais, mas também o
operário que vem a morrer encerrado dentro dos muros do sanatório.
Em 1944, publica Mineiros, romance que escrevera em
Monchique durante a convalescença e que ficara na gaveta aguardando melhor
oportunidade. Nele debruça-se sobre a condição miserável dos mineiros, em
companhia dos quais desceu às profundezas da terra. Desta obra, dirá Maria de
Lourdes Belchior: «(…) a mina é o herói; aos homens que lá trabalham repugna
serem explorados pelos outros homens e não querem ser roda dentada (isto é, sem
pensamento) de uma engrenagem qualquer» (Os
Homens e os Livros, vol. II, 1980, pp.155-56).
Cidade, o livro que escreveu a seguiu, não seria publicado devido a mutilações e
imposições da censura salazarista. A obra abordava o proletariado industrial,
mais uma vez retratado em largas pinceladas neorrealistas.
Manuel do Nascimento
não desarma, nem abandona a luta em situações tão adversas, mesmo quando seria
de esperar um certo período de castração intelectual que lhe coibisse o
espírito e lhe limitasse a capacidade de escrever.
O quarto título, O Aço Mudou de Têmpera, editado em 1946
pela Livraria Latina Editora, do Porto, seria a obra que mais o marcaria como
escritor, não sem que daí lhe viessem também alguns dissabores e perseguições
por parte da polícia política do regime salazarista.
Em 1954, a censura permite-lhe publicar o romance Agonia, embora nesta obra seja evidente o desgaste ideológico
sofrido pelos cortes e pressões daquela tenebrosa instituição.
O livro teve edição na
Catalunha, onde parece ter tido bom acolhimento, e em cujo prefácio Manuel do
Nascimento é apresentado como «una de les figures més importants de la
literatura portuguesa actual». Ainda em catalão sairiam dois dos seus contos
integrados em antologias.
Segue-se o volume de
contos intitulado O Último Espectáculo
(1955), género em que se mostra bastante à vontade. Pelo meio publicou ainda
dois pequenos livros de coleção, acessíveis às pequenas bolsas: Nada de Importância e Suspeita, este último na colecção
«Mosaico», de que foi diretor literário e onde insere algumas das novelas e
contos já anteriormente publicados.
Finalmente, é tempo
para uma reedição de Eu Queria Viver!,
saído em 1958 pela mão da Arcádia, onde trabalhava. Nesta editora publicará
ainda Histórias de Mineiros (1960),
livro onde regressa ao tema da mina que tanto o marcou, assumindo- -se como um
verdadeiro cronista dos mineiros e denunciando, mais uma vez, a sua situação
miserável e pouco dignificante.
Atormentado pela
doença, mas tendo concretizado o seu sonho de escritor, apenas publicará mais
um livro, Encontros, um primeiro
volume de entrevistas a figuras cimeiras da vida intelectual, fruto da sua atividade
de jornalista.
(*) Biografia partilhada no
Grupo Fascismo Nunca Mais por Mário Ribeiro Caiado.