Excerto da obra
Chegaram as férias. [Nweti] foi com os pais, de carro, até uma praia muito longe da cidade. Os pais tinham alugado uma casa, em madeira, muito pequenina, toda pintada de branco. Parecia uma casa de bonecas. Anoitecia quando chegaram. A mãe cozinhou uma omelete. Comeram e foram-se deitar. Um enorme mosquiteiro protegia a cama de Nweti. A menina gostou daquilo. Sentia-se uma rainha num palácio.
Despertou na manhã seguinte com o cantar dos pássaros. Os
pais ainda dormiam. Levantou-se sem fazer ruído, abriu a porta e saiu. A areia
da praia cintilava, tocada pela luz dos primeiros raios de sol. Não se via
ninguém. O ar cheirava a maresia. O mar parecia um vidro azul-esverdeado,
iluminado por dentro.
Nweti afastou-se, caminhando junto à água. Avançara um
bom bocado quando viu uma mulher sentada na areia, de pernas cruzadas. Era alta
e elegante, de uma beleza sem esforço, como imaginamos que devem ser as
princesas dos contos de fadas.
– Ah, chegaste, Lua! – murmurou a mulher, sorrindo. –
Estávamos à tua espera.
A menina estranhou:
– Lua?!
– Não sabes que o teu nome significa Lua?
Sim, Nweti sabia. O pai dizia-lhe isso muitas vezes.
– Sim. Como sabes o meu nome?
A mulher voltou a sorrir. Sorria e era como se o Sol
nascesse do sorriso dela:
– Nós somos teus amigos.
– Nós?!
– Eu e este pequeno senhor aqui.
Enquanto falava, a mulher estendeu a mão direita. E foi
então que Nweti o viu. Não podia ser, mas estava ali:
– Eustáquio?!
Sim, seria capaz de reconhecer o seu amigo entre um
milhão de outros caranguejos‑eremitas. Era Eustáquio. O animalzinho não falou.
Caranguejos-eremitas não falam. Todavia, Nweti escutou dentro de si, um pouco
como se tivesse engolido um telemóvel, a voz alegre do minúsculo caranguejo:
– Bom dia, Nweti!
Nweti esfregou os olhos, espantada:
– Tu existes mesmo? Pensei que fosse só um sonho…
A mulher voltou a sorrir:
– Se existimos nos teus sonhos, então existimos
realmente. Existimos enquanto tu dormes. Aliás, tudo o que existe nos sonhos
existe em algum lado.
José Eduardo Agualusa, Nweti
e o Mar (Exercícios para Sonhar Sereias), Alfragide, Publicações Dom Quixote,
2011.
(Texto com supressões)
Continuação da história
No dia seguinte, ainda mal o
sol nascera, já Nweti tinha chegado à praia, porque estava ansiosa por
encontrar o seu amigo Eustáquio. Ela andou, andou, andou… procurou atrás das
dunas, mas não o viu. Ficou desapontada, mas não desistiu.
Após ter
percorrido mais algumas centenas de metros, distinguiu ao longe, atrás de uma
duna, uma velha cabana abandonada, com um telhado de olmo e janelas partidas e
cheias de teias de aranha. A cabana não tinha porta e Nweti espreitou. Caído no
chão, no meio da sala, estava um enorme javali. A menina entrou para ver se o
javali precisava de ajuda, mas ele já não respirava. Quando ela estava
debruçada, uma enorme sombra apareceu, bloqueando a luz. Era um enorme animal,
metade leão e metade águia, mais conhecido como grifo.
Quando
viu a menina, o grifo perguntou com uma voz terrível:
− Quem
ousou entrar na minha cabana?
Muito
surpreendida, mas sem mostrar nenhum medo, Nweti disse:
− Eu só
vim à procura do Eustáquio. Conhece-lo? Viste-o?
O grifo,
feliz por a menina conhecer o seu melhor amigo, respondeu-lhe, já calmo:
− Sim, conheço muito bem o Eustáquio, porque, quando eu tinha muitos pesadelos, ele e a sua companheira ajudaram-me com uma receita de chá milagroso que me fez dormir como um bebé!
− Ah! Que
giro! Podes levar-me até ele, por favor?
Como
sentiu que o Eustáquio ficaria muito feliz por encontrar Nweti, o grifo
carregou-a nos seus ombros e voou velozmente até à gruta onde se encontrava o
caranguejo.
Mayan Goller, 9.º C, n.º 10
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