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Fotografia: @N.Lemos. |
«Duas
filas de casas frente a frente beijando o pó na estrada, ruelas contorcidas
onde as rodas dos carros marcam sulcos cada vez mais profundos, homens sentados
no chão, crianças jogando com bolas de trapo e … mais nada. Só os homens
olhando o céu numa súplica, só as mulheres gritando pragas aos filhos que
fogem. O resto é silêncio, é a vida parada num quebrar de anseios e de força
que chega ao desespero. […]»
Manuel do Nascimento, «Sapo e Lagarto»
in O Último Espetáculo.
O que
pode levar uma aldeia inteira a zombar de um Homem só? O que pode levar todos
os homens, mulheres e crianças incluídas de uma aldeia inteira a troçar de um
pobre velho? Palavras como facas a cair sobre ombros fracos e gastos. A raiva. O
que move a crueldade? Há limites para o perdão?
-
Sapo e Lagarto, o meu pai matou um porco!
O conto «Sapo e
Lagarto», do escritor monchiquense Manuel do Nascimento, aborda a questão do «bullying»,
de uma forma que suscita inúmeras questões. É um conto curto, mas profundo.
Poderás, talvez, reconhecer nele Monchique e até algumas personagens que
habitam atualmente na vila … apesar de o livro ter sido inicialmente publicado no
já longínquo ano de 1955.
O Último Espetáculo, a que pertence o conto «Sapo e Lagarto», faz parte da biblioteca
da tua escola. E encontra-se à tua espera!
Mas se quiseres saber
como é que a tua colega Sofia Duarte, do 7.º B, continuou essa história, de
forma bem expressiva, criando um final completamente diferente, só tens que
continuar a ler esta publicação, o texto vem já a seguir. Vale a pena a leitura!
(…) Em
meados de dezembro, as crianças não podiam brincar na rua. Aquela dádiva do
céu, tão esperada apenas há alguns meses, é agora a razão de toda a rua
estar enlameada. Neste momento, os pequenos miúdos que lá moram passam o dia a
olhar pela janela, vendo o céu chorar. Aguardando que talvez algo inesperado,
eventualmente sinistro, atravesse aquelas ruas molhadas, entregando a todos um
pequeno entretenimento.
Podendo
ver aquele quotidiano, o desprezo é o prato principal. Apenas naqueles
subúrbios, a indiferença – ao contrário da comida – era algo abundante. Entre
aqueles caminhos (não podendo sequer ser chamados de ruelas), vivia um ser que
noutros tempos tinha sido conhecido como compositor.
Há alguns
anos, aquelas duas fileiras de casas não estavam sozinhas, eram
acompanhadas por enormes prédios, onde se trabalhavam minerais e rochas vindos
de uma pedreira lá perto, entre outras manufaturas. Mas o mais notável era a
construção de instrumentos musicais para os vários teatros, escolas de arte e
salas de espetáculos da zona. O pobre homem, agora isolado, era a razão da
antiga cidade ter sido tão aconchegante, tão unida e com uma beleza
incomparável. Atualmente, a localidade é revestida por uma enorme nuvem negra.
Passados
alguns meses, as brincadeiras regressaram, tal como os raios de ouro. E como
esperado por todos os habitantes, aquela pessoa, agora apagada como um risco de
giz, apareceu. Trazia vestimentas negras, mas aquele chapéu, noutra altura
escondendo o seu rosto, estava bem colocado. Transmitia um olhar provocador. O
Homem foi para o centro da aldeia e gritou como nunca ninguém tinha gritado,
como nunca ninguém tinha ouvido, como nunca ninguém alguma vez tinha imaginado:
- Sapo e
lagarto!
Chamou a
atenção de todos e com a mesma emoção voltou a gritar:
- O sapo
mudou de tanque! O lagarto mudou de jardim! O coração que aqui morou está
despedaçado em cada uma das vossa casas. Os prédios que havia foram demolidos,
porque ninguém deu importância ao tesouro que tinham. A esperança saiu, tal
como as pessoas que cá viviam. A beleza foi destruída pela corrupção, pelo
egoísmo.
Tirou a
guitarra que tinha às costas e cantou a canção que tinha escrito quando sentiu
que a cidade onde tinha sido feliz tinha mudado de sítio. Agora, no mesmo
local, cresciam furiosamente mágoas.
Por assim
dizer, era o lugar onde a vida tinha florescido no melhor de si, aquela vida
que nunca tinha esperado conhecer. O tempo passou. Mas, quando se apercebeu que
as mesmas flores de antes estavam, afinal, debaixo do seu nariz, já tinha
arrumado as malas e seguido viagem.
Sofia
Duarte, 7.º B, n.º 14.
1 comentário:
Uau! Que bonito! parabéns, Sofia!
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