sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

LEITURAS E TEATRO 2023: «NA ROTA DE GIL VICENTE»

Acabara de amanhecer, mas já se juntara muita gente, sobretudo gente jovem, pronta para a viagem «e há de partir logo essora».

O chamamento «À barca, à barca, oulá!, / que temos gentil maré» era do conhecimento geral naquele dia 16 do mês de fevereiro de 2023. Não obstante, não havia cais nem barcas nem barqueiros. Nem o destino era o Inferno ou o Paraíso.

Quanto aos passageiros… qualquer semelhança mínima com as personagens-tipo vicentinas seria pura ficção.

Estariam todos? Faltava alguém? Era melhor aguardar mais um bocadinho: «veremos se vem alguém, / merecedor de tal bem, /que deva de entrar aqui».

Mas às sete da manhã em ponto, «Asinha, que se quer ir! / Ó que tempo de partir». Sem arrais que impedisse ou condicionasse a entrada e sem «cárrega» que embaraçasse, todos os passageiros se instalaram confortavelmente sem ao menos perguntar «E pera onde é a viagem?». Esta era, aliás, uma questão desnecessária, já que todos conheciam detalhadamente a rota.

Rumou-se a Lisboa, num destino literário, artístico e cultural, ao encontro de mestre Gil Vicente e da sua obra, numa Lisboa do século XVI.

O recuo no tempo, a viagem ao passado, começou no Museu Nacional da Arte Antiga. Ao observar os Painéis de São Vicente (presentemente em restauro), deparámo-nos com uma solene e monumental assembleia representativa da Corte e de vários grupos sociais da época vicentina. Na pintura O Inferno, de um mestre português desconhecido, contemporâneo de Gil Vicente, fomos confrontados com uma impressionante imagem do Inferno, que inventaria os suplícios eternos em relação aos pecados capitais. E ao observar a Custódia de Belém, o dramaturgo Gil Vicente foi, por momentos, esquecido para nos deixar deslumbrados com o seu mérito artístico na área da ourivesaria.

O regresso à Lisboa contemporânea fez-se na hora de almoço: o bulício atribulado do trânsito, uma passagem rápida pelo Parque das Nações e uma refeição ligeira tão do agrado dos jovens viajantes trouxeram-nos de volta à realidade do século XXI.

Mas o retorno ao século XVI estava agendado para as 15 horas, no espaço «O Sonho», para assistência à representação da peça Auto da Barca do Inferno, numa excecional encenação de Ruy Pessoa. Aqui, o elenco sabe tirar partido dos efeitos de cómico e, sem nunca desrespeitar o texto de Gil Vicente, trazem para cena apontamentos atuais, numa interessante interação com os espetadores, que envolvem e cativam a assistência. Mas o aviso ficara feito:

«Vigiai-vos, pecadores,
que, despois da sepultura,
neste rio está a ventura
de prazeres ou dolores!»

GALERIA DE FOTOS
Apreciando os Painéis de São Vicente, em restauro, no Museu Nacional da Arte Antiga.
Escutando atentamente a explicação sobre a pintura O Inferno.
Ouvindo os esclarecimentos sobre a Custódia de Belém.
O cenário e os atores do Auto da Barco do Inferno no final da representação.
Uma das nossas alunas em palco.

PROGRAMA DA VISITA DE ESTUDO



NOTA: Esta visita de estudo dos alunos do 9.º ano só foi possível graças ao apoio da Câmara Municipal de Monchique, que cedeu o transporte e garantiu o pagamento das entradas no teatro.

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